Por ocasião da sua tomada de posse, em 5 de setembro, o novo reitor da UBI pronunciou um discurso que constitui uma análise da situação atual da Beira Interior e dos desafios a que ela está confrontada…
O compromisso com a região está na génese da criação da Universidade da Beira Interior, faz parte do seu nome, e é, por isso, uma das suas razões de ser. Esse compromisso reafirmo-o solenemente neste momento em que assumo as funções de reitor. Faço-o na convicção de que a sustentação da UBI e da região se implicam mutuamente. O contributo da UBI para o desenvolvimento regional tem sido frequentemente salientado, mas é altura de realçar também o outro lado da relação, o papel que a região assume na vida e na afirmação da universidade. Há uma reciprocidade na relação, uma comunhão de fortunas, que determina o sucesso, ou o insucesso, de uma e outra das partes. Não há universidades pujantes em regiões deprimidas, nem regiões social e economicamente fortes sem universidades dinâmicas e de reconhecida qualidade.
A melhor maneira de a região apoiar a UBI é ser uma região desenvolvida e sustentável. A Beira Interior tem hoje infraestruturas boas : escolas, hospitais, equipamentos sociais e desportivos, vias de acesso, redes fiáveis de energia e de telecomunicações, que a comparam a qualquer região desenvolvida da Europa. O problema — e é um grande problema ! — reside na baixa densidade populacional, no envelhecimento acentuado da população, na fraca atividade económica e cultural e na correspondente falta de emprego. O que a UBI precisa da região e, em particular, dos responsáveis políticos, dos empresários e dos demais atores relevantes da sociedade é que tudo façam para inverter a situação demográfica, económica e cultural em que a região se encontra. Se a Beira Interior se tornar uma região dinâmica como a zona de Aveiro ou o Minho, esse será o maior apoio, ainda que indireto, á sua universidade, a UBI.
Podemos concretizar um pouco mais. Se as escolas dos ensinos básico e secundário estiverem cheias, se o ensino aí ministrado for de qualidade, se a região tiver uma economia capaz de absorver mão de obra superiormente qualificada, se houver uma vida cultural vibrante, então a UBI terá uma sustentação forte e o seu futuro estará definitivamente assegurado. Uma região desenvolvida terá capacidade, e a legitimidade, de exigir á universidade padrões elevados de qualidade.
Os cenários demográfico-económicos
Sabemos que as coisas não são assim. A região é uma das mais gravemente atingidas pela crise demográfica em que Portugal mergulhou nas últimas dezenas de anos. O país tem uma das taxas de natalidade mais baixas do mundo, a fecundidade é de 1,28, muito longe da taxa de 2,1 como o nível mínimo para a efetiva substituição de gerações, e a forte emigração, provocada pela crise, agrava o problema. Um quinto da população portuguesa tem mais de 65 anos de idade e Portugal é um dos países mais envelhecidos da União Europeia. Em 2012 nasceram menos de 90 mil crianças em Portugal, menos 7 mil do que em 2011, e no primeiro semestre deste ano, 2013, houve menos 4 mil do que em igual período do ano passado. Para sabermos bem o que isso significa, basta dizer que em 1960 nasceram 214 mil bebés em Portugal, e em 1980 nasceram 158 mil. Este ano vamos ter quase menos 50 % de bebés que em 1980. São números com consequências, nomeadamente na população escolar e no número de estudantes que se inscrevem no ensino superior.
Nos últimos anos, os candidatos ao ensino superior têm vindo a diminuir, e, é óbvio, que a diminuição tenderá a agravar-se fortemente a médio prazo (daqui a 10-20 anos). Este ano temos apenas 40 546 estudantes inscritos na primeira fase do concurso nacional de acesso, menos 4 847 alunos do que em 2012 quando houve 45 838 candidaturas. Menos 10 % ! (compreenderão pois a minha expectativa preocupada quanto á colocação de alunos na UBI na próxima segunda feira). Mesmo que esta redução brutal seja em parte devida a factores circunstanciais, como os maus resultados nos exames nacionais do ensino secundário, o contínuo declínio demográfico não deixará de se sentir nas próximas décadas.
O cenário triste e preocupante da demografia portuguesa agrava-se, e muito, quanto nos cingimos ás regiões do Interior. O estudo Demospin, "Demografia Economicamente Sustentável. Reverter o Declínio em áreas Periféricas", elaborado por investigadores das Universidades de Aveiro, Coimbra, UBI, e dos Institutos Politécnicos de Castelo Branco e Leiria, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, estudo que será apresentado publicamente no Fundão em 25 e 26 de Outubro, mostra bem quão sombrios são os cenários demográfico-económicos da Beira Interior. Se nada for feito para contrariar as tendências atuais, se continuarmos como até aqui, em 2100 teremos zonas do Interior, como a Beira Interior Norte, com um quarto da população atual, e mesmo as zonas mais habitadas do corredor urbano, servido por autoestrada e ferrovia, terão menos de 40% da população atual, como a Cova da Beira.
É óbvio que não podemos continuar assim, porque assim a região será, dentro de décadas, uma reserva cinegética sem lugar para universidades.
A mudança dos valores
Não ignoro que a baixa fecundidade e a urbanização são tendências globais, assentes em valores civilizacionais. Estou ciente de que os valores não se alteram de um momento para o outro e que é muito difícil contrariar local ou regionalmente tendências globais. É difícil, mas não é impossível, e, estando nós na Beira Interior entre as primeiras vítimas dessas tendências, é nosso dever lutar contra elas.
É um facto que as pessoas preferem viver nos grandes centros urbanos. Isso é uma realidade na China, na Alemanha, no Brasil, em África ; e Portugal não foge à regra. Esta preferência pela vida urbana é certamente uma das principais causas do decréscimo de natalidade. O espaço habitacional é muito menor, não existe a rua como local de convívio e brincadeira com outras crianças, desaparece a família alargada como ambiente de suporte e a vigilância permanente e contínua sobre os filhos nos espaços públicos torna-se necessidade e fardo. Não haja dúvida : é muito mais fácil, e muito mais barato, criar uma família numerosa numa aldeia do que numa cidade.
Os valores mudaram, é verdade. O que se coloca hoje em primeiro lugar como sentido da vida é a autorrealização, a satisfação pessoal. Um curso superior, uma profissão com elevado reconhecimento social, um emprego bem remunerado e seguro, são hoje os principais objectivos de um jovem nas sociedades atuais. O casamento e os filhos são objectivos subsequentes. Importantes, sem dúvida, mas claramente deslocados para uma fase posterior da vida. Quantas vezes, porém, a obtenção da estabilidade profissional e económica não leva muito mais tempo que o previsto, empurrando a parentalidade para uma época tardia da vida, para a década dos 30 e dos 40, menos propícia em termos biológicos e psicológicos. E então o mais comum é um casal ficar pelo filho único.
Sigmund Freud definiu os instintos do Eros e do Thanatos, da vida e da morte, como forças motrizes da existência humana. O estranho da nossa civilização é como o eros, o princípio da vida, e da reprodução, se generalizou, banalizou e inutilizou. O erotismo que invadiu todas as esferas da vida humana — e basta olhar a publicidade — deixou de ser uma força criadora de abertura e ligação aos outros, para se tornar um objectivo em si mesmo, em instinto egocêntrico e de autossatisfação. Mas, ao transformar-se em hedonismo apenas preocupado com o momento presente, perdeu a dimensão de futuro que lhe é intrinsecamente própria e com isso tornou-se inane. O resultado deste auto-centramento erótico é, mais do que estranho, paradoxal. A sua inanidade tornou-o uma forma de Thanatos social. Na verdade, como denominar a falta de vontade de manter a comunidade em que vivemos, de assegurar o seu futuro, senão como suicídio colectivo a prazo ?
Se alguém achar que isto é apenas consideração teórica, aconselho-o a verificar os registos de nascimento e de óbito da maioria dos concelhos da região ou então visitar aldeias onde as escolas primárias fecharam há muito e onde se pode assistir á morte lenta de comunidades outrora cheias de vida.
Inverter a espiral recessiva
Se não podemos continuar assim, que devemos fazer ? Darmo-nos conta do problema é o primeiro passo. A região precisa de gente nova, precisa de crianças, precisa de alunos para os vários ciclos de estudos dos ensinos básico, secundário e superior. Precisa de casais jovens para gerar e criar essas crianças, precisa de empregos para manter os jovens naturais da região e atrair jovens de outras partes do país e do mundo, precisa de uma economia forte para criar os empregos, precisa de ter uma vida cultural rica para animar os residentes, precisa de um estado espírito de que o nosso lugar é aqui, de que a Beira Interior é uma terra onde se vive bem no presente e de que oferece boas possibilidades para os filhos e para os netos. O presente ganha-se projetando o futuro, e é isso que temos de fazer.
Não deixa de ser surreal, ao mesmo tempo irónico e cruel, que a região tinha população quando não tinha condições, quando lhe faltava água canalizada, energia eléctrica, saneamento básico, escolas, centros de saúde, equipamentos desportivos, vias de comunicação, e agora que tem tudo isso, inclusive cortes de ténis, piscinas aquecidas, Internet de banda larga, não tenha população. Gastaram-se rios de dinheiro, nomeadamente os muitos milhões dos fundos comunitários, para as infraestruturas que servissem as pessoas, e agora que as temos, estamos a perder as pessoas que delas se servem e faltam-nos as pessoas que delas se poderiam servir.
Certamente o Governo Central tem graves culpas no descalabro demográfico que atingiu o país e sobretudo o Interior. As obras de regime, centros culturais, estádios de futebol, pontes faustosas, autoestradas duplicadas ou sem movimento, submarinos desnecessários, levaram o dinheiro que faltou para pagar o abono de família a todos os primeiros filhos e o aumentar crescentemente e significativamente para os filhos seguintes. Sobretudo ao nível fiscal faltam apoios ás famílias numerosas. Mas o poder local também poderia fazer muito mais em políticas de pró-natalidade. A título de exemplo, não se compreende como os consumos de água e de saneamento são taxados por habitação independentemente do número de pessoas que nela habitam. Claro que se for um único habitante o mais provável é que se fique pelo primeiro escalão, mas se for uma família numerosa o consumo dispara e aí é taxada pelos escalões de consumo superior muitíssimo mais caros. E, por outro lado, porque não instituírem as autarquias bolsas de estudo para os segundos, terceiros e quartos filhos num montante superior ? Porventura não é uma escola primária cheia um bem maior que rotundas e pavilhões, ainda por cima sem movimento e vazios ?
A criação de emprego é imprescindível para fixar e atrair pessoas. Repito, é imprescindível, ou seja, é condição necessária. Mas não é suficiente, e sublinho : não é suficiente. Há quem trabalhe na região, nomeadamente em empregos qualificados, e não viva na região. As razões são diversas : uns porque o cônjuge trabalha no Litoral, porque têm lá a casa de família, porque os filhos estudam lá, ou então porque não se adaptam ao ritmo de uma cidade de província, ou porque acham que a vida na grande cidade tem atrações e encantos únicos.
Ora é crucial que quem trabalhe no Interior também se fixe aqui. Pessoas atraem pessoas, crianças atraem crianças, e quanto mais se fixarem no Interior mais empregos criarão. Usando a linguagem económica do momento, temos de inverter a espiral recessiva, demográfica e económica. A economia puxa pela demografia, mas a demografia puxa também pela economia. As autarquias da região têm assim de privilegiar mais a vida concreta das pessoas, em particular dos casais jovens. E há argumentos para atrair gente nova das grandes cidades. De facto, a vida fora dos grandes centros urbanos oferece uma qualidade de vida superior, no espaço habitacional, no tempo disponível, no custo de vida, no atendimento personalizado em grande parte dos serviços, na superior segurança de bens e pessoas. Por outro lado, a Internet em banda larga disponibiliza em qualquer parte distante, na província mais profunda, o acesso a informação e a serviços que dantes só existiam nos grandes centros.
Resumindo brevemente esta parte, a Beira Interior tem de se tornar uma região propícia á natalidade e á fixação de pessoas. A sua sustentabilidade disso depende.
A ligação da região ao mundo
A criação do ensino superior nas décadas de 70 e 80 foi fundamental para a revitalização dos 3 centros urbanos da região, Covilhã, Castelo Branco e Guarda. Não só vieram qualificar a população jovem natural da região, mas trouxeram jovens das outras partes do país, do Minho á Madeira, e estudantes de outras partes do mundo, em particular dos países lusófonos e da União Europeia. Se é verdade que muitos, certamente a maior parte, saíram da região após os seus estudos, não menos verdade é que muitos outros ficaram, aqui trabalham e passaram a fazer parte da sociedade. E com os alunos, e por causa deles, vieram professores e investigadores, nacionais e estrangeiros, que se fixaram e enriqueceram sobremaneira a região tanto de um ponto de vista humano, como cultural e científico. Foram esses professores vindos de fora que tornaram possível o ensino superior na região, lhe deram estatuto e tornaram competitivas as respectivas instituições. A região tornou-se mais cosmopolita, abriu-se ao exterior e ganhou mais mundo.
Não há dúvida que, com a criação do ensino superior, a Beira Interior deu um salto de gigante na sua afirmação social, económica e científica. Há uma intermediação que o ensino superior protagoniza entre o regional, o nacional e o internacional, factor crítico para a inserção baseada no conhecimento e positivamente diferenciadora da região na economia global.
De facto, não há desenvolvimento á margem dos fluxos de pessoas e bens, de ideias, mercadorias e capitais, que caracterizam um mundo cada mais globalizado. Quem se isola fica definitivamente para trás. A UBI, o IPG e o IPCB são veículos privilegiados da ligação da região ao mundo, e, por isso, a sustentabilidade económica e social da região depende em muito deles. A saúde e o vigor destas instituições são fundamentais para a viabilidade da região. É necessário que todos os autarcas e demais protagonistas políticos e sociais da região tenham bem consciência da importância das suas instituições de ensino superior para a atração de investimento, para a criação de emprego e para a vitalidade económica e demográfica dos seus concelhos. Considerá-las apenas como agências do governo central que servem tão só como canais de transferências do orçamento de Estado para a região é miopia grave. De facto, não se compreende como é que uma autarquia pode encarar as taxas de água e saneamento aplicáveis a uma instituição de Ensino Superior como geradoras de boa receita, certa e permanente, para cobrir despesas ou dívidas do município. É como matar uma galinha de ovos de oiro, perdendo a médio prazo, em múltiplos e dolorosamente, o que lucra no curto prazo.
O Data Center da Portugal Telecom na Covilhã e o Centro de Serviços da Altran no Fundão são bons exemplos do que podem ser mais investimentos em áreas inovadoras e geradores de emprego. Ora estes investimentos resultaram de decisões em que muito pesou a presença da UBI na região. Investimentos associados a tecnologia de ponta necessitam da vizinhança de instituições de ensino superior com qualidade na investigação e no ensino. Uma população jovem e qualificada é o melhor atrativo para a captação de investimentos geradores de riqueza e de emprego. Vamos então apostar nesta espiral de crescimento. Para isso temos de, em conjunto e em sintonia, trabalhar como um todo. As autarquias não podem ser mini-feudos que se esgotam em rivalidades bairristas de alecrim e manjerona. Ou nos unimos todos na região para a tornar uma região mais forte, ou iremos perdendo crescente e inexoravelmente a força económica e política que ainda nos resta. Julgar que um município pode crescer e florescer no meio da desolação demográfica dos municípios circundantes é pura ilusão. Oásis no meio do deserto só no Saara. Um concelho que perde população e dinamismo económico em favor de um concelho vizinho é apenas o primeiro passo numa cadeia de dominós, onde a queda de um provocará a queda do seguinte e assim sucessivamente.
O projeto de uma comunidade regional
A Beira Interior faz parte da UBI antes da UBI, desde a criação do Instituto Universitário da Beira Interior em 1979 que só viria a transformar-se em universidade em 1986. Não tendo vingado a criação da Região da Beira Interior, por referendo popular sobre a regionalização em Portugal, ela existe como desígnio da própria universidade. De facto, não há um lastro histórico identitário como ocorre por exemplo em outras novas universidades públicas portuguesas (Universidade do Minho ou Universidade do Algarve), pelo que, à falta de história, importa realçar e realizar o projeto de uma comunidade regional tricêntrica que partilha território, gentes, costumes e enfrenta problemas e desafios que só unida — mesmo que não administrativamente, pelo menos de facto — pode resolver e ganhar.
A criação da Faculdade de Ciências da Saúde em 1998 a sua entrada em funcionamento em 2000, em particular com o curso de Medicina, deu azo a uma articulação reforçada dos hospitais da região, Guarda, Covilhã e Castelo Branco. Sem os três hospitais o Curso de Medicina não pode funcionar. Mas, simultaneamente, os três hospitais beneficiam com a associação á Faculdade de Ciências da Saúde e de uma maior ligação entre si. Porém, é necessário ir mais longe. Em artigo publicado no Jornal do Fundão (10 de Março de 2011), Manuel Lemos, médico especialista e professor da UBI, escrevia que, e cito : “a falta de competitividade na área da saúde e o problema da fixação dos médicos tem sobretudo a haver com a dispersão dos serviços de saúde da região, resultando em unidades de pequena dimensão, sem massa crítica para evoluir e com uma escala que não permite competir pela atração de novos profissionais. Este aspecto é mais importante que do que as razões habitualmente invocadas, como a interioridade ou falta de incentivos financeiros”.
Concordo com esta análise, como concordo com a sua proposta de que a “fusão de serviços idênticos distribuídos pela região permitiria a constituição de equipas clínicas de maiores dimensões e com maior capacidade de diferenciação técnica … aumentando a eficiência e a produtividade, e, com isso, criando as condições necessárias para a implementação de especialidades previamente inexistentes e que apenas se justiçam numa estrutura de maiores dimensões. O princípio geral da argumentação é bem explicitado pelo professor: é preferível ter um bom serviço hospitalar do que três serviços de qualidade inferior”. Quem pode discordar deste princípio ? Cito novamente o texto do Prof. Manuel Lemos : “O problema da proximidade ás populações é uma falsa questão, pois estas há muito se habituaram a ter que percorrer frequentemente centenas de quilómetros até ao litoral para obter os serviços diferenciados de que necessitam. A saúde das populações defende-se com a concentração de serviços e quem disser o contrário, ou tem falta de visão, ou está de má fé”.
Sim, digo eu, porque não havemos de ter um serviço de ponta no Hospital da Guarda, um na Covilhã e outro em Castelo Branco ? Sei que as administrações dos três hospitais trabalham neste momento em estreita sintonia e essa é a melhor forma de servir as populações e também o melhor que pode acontecer á Faculdade de Ciências da Saúde e á formação dos estudantes de Medicina. Como reitor da UBI, só me posso regozijar com isso.
Promover a recuperação do Interior
O que se passa na saúde é também válido nos outros campos. A UBI não pode comprometer-se seriamente com a região sem uma estreita colaboração com os Institutos Politécnicos da Guarda e de Castelo Branco. Há áreas em que nos complementamos e áreas em que podemos reforçar-nos. Cabe-nos a nós, instituições de ensino superior, a quem compete pautar-se pela racionalidade, vencer preconceitos, dar as mãos e em colaboração com outras entidades promover a recuperação do Interior.
Ainda por cima a reorganização da rede do ensino superior a nível nacional está na ordem do dia, a evolução demográfica a isso obriga, e não podemos deixar de, entre nós, debatermos as soluções que salvaguardem os interesses do Interior e de, em conjunto, lutarmos por elas. O despacho orientador de Junho sobre a oferta formativa do ensino superior criou as áreas de coordenação regional, sendo a nossa a que engloba o IPCB, o IPG e a UBI. Porventura vamos assumir um papel passivo, aceitando sem mais o que o poder central decidir sobre a matéria, ou vamos dar o nosso contributo para soluções que salvaguardem e promovam as nossas instituições e a região ? Tenho a certeza de que saberei encontrar conjuntamente com os presidentes do IPCB e do IPG, Professores Carlos Maia e Constantino Rei, com quem tive já o prazer de conversar depois da minha eleição, e cuja presença nesta cerimónia muito me honra, uma plataforma de diálogo franca e permanente para unirmos esforços face aos desafios da reorganização iminente.
Conhecimento e inovação
O próximo Quadro Comunitário de Apoio, 2014-2020, ao estabelecer como primeira referência na aplicação dos fundos o crescimento baseado no conhecimento e na inovação, irá exigir uma cooperação mais reforçada entre universidades, politécnicos, empresas, autarquias e instituições sociais e culturais. A tónica é colocada na transferência de tecnologia. Ou seja, instituições de ensino e de investigação terão necessariamente de se ligar á economia real para concorrer aos projetos comunitários e vice-versa. Necessitamos uns dos outros. Reafirmo a disponibilidade da UBI para a colaboração com as empresas e as autarquias para a elaboração, candidatura e execução de projetos tanto de financiamento nacional como comunitário.
E, desde já, lanço aqui uma proposta para as instituições de ensino superior da região, autarquias e associações empresariais da Beira Interior se reunirem em seminário pelo menos uma vez por ano para estudarmos e elaborarmos projetos comuns. Gostaria que esse primeiro encontro tivesse lugar ainda este ano civil, na segunda quinzena de Novembro ou na primeira de Dezembro. Proponho ainda que esses encontros se realizem alternadamente nas três instituições de ensino superior da região. Estou convencido de que conversando nos entenderemos, juntaremos esforços e nos tornaremos mais fortes da prossecução dos interesses da região. E creio que desse modo realizaremos o intuito que presidiu á criação do ensino superior na região pelo Prof. Veiga Simão em 1973 e cumpriremos o sonho do Dr. Duarte Simões com a entrada em funcionamento do Instituto Politécnico da Covilhã em 1975: o de desenvolver a região mediante a formação superior das suas gentes.
A internacionalização universitária
De entre os vários contributos que a UBI presta á região destaca-se o da internacionalização. Por natureza, uma universidade é aberta ao mundo. O intercâmbio académico de docentes e alunos com universidades e regiões de outros países e outras culturas é constitutivo da qualidade do ensino ministrado e da investigação realizada. O conhecimento tem um condão extraordinário, quanto mais se difunde mais aumenta. Se é bom que os nossos docentes e alunos participem em congressos e colóquios no estrangeiro e façam sabáticas, estágios e semestres em universidades estrangeiras, e tragam de lá novas ideias, experiências e contactos, tão ou mais importante é a vinda para aqui de professores e alunos de outros países ; porque isso significa antes de mais uma riqueza humana, cultural e científica para nós mesmos.
Os programas de intercâmbio académico financiados pela Comissão Europeia, de que se destaca o Programa Erasmus, são claramente exemplos de iniciativas muito bem sucedidas dentro da União Europeia. Estes programas vieram melhorar significativamente a qualidade das nossas universidades, além de fazerem uma aproximação ímpar no entendimento entre os povos. Só quem ignora a história secular de guerras entre os povos europeus pode menosprezar a importância destes programas de internacionalização académica e científica.
Mas na internacionalização universitária merecem um claro destaque os países de língua portuguesa. A comunidade linguística é dos laços mais fortes no ensino e na investigação. A língua portuguesa é uma força de afirmação na cena internacional, pela quantidade dos seus falantes e pela diversidade geográfica dos países lusófonos. O esforço que nos últimos anos tem sido feito para aumentar e sobretudo dar vida aos convénios de cooperação com instituições de ensino superior dos países lusófonos será incrementado. Acontece que enquanto em Portugal a oferta de vagas no ensino superior é superior á demanda, nos outros países, em particular no Brasil e em Angola, a demanda é superior á oferta. A cooperação impõe-se, portanto, para benefício mútuo.
Uma universidade coesa e plural
Ao escolher como tema do discurso de tomada de posse o compromisso que a UBI tem com a região, não esqueço que o lema do programa de ação para o mandato que hoje inicio era e é “uma universidade coesa e plural". Mas a coesão só se obtém quando os princípios se encontram claramente definidos e interiorizados por todos os membros da comunidade académica. E um dos princípios enunciados era justamente o forte compromisso com a região. Dos outros princípios do programa de ação e dos passos para a sua concretização, e que dizem sobretudo respeito á vida interna da UBI, falarei no discurso da abertura solene do ano lectivo, em cerimónia que ocorrerá em Outubro.
Mas hoje achei que devia chamar a atenção para a sustentabilidade demográfica da UBI e da própria região. É um desafio geral, que nos toca a todos, e que, pela sua gravidade, tem de merecer particular atenção por toda a sociedade, tanto regional como nacional.
É um desafio que, tenho a certeza, iremos vencer. O percurso da UBI é uma história de obstáculos ultrapassados com tenacidade e perseverança. Sim, hoje a nossa luta é para manter, solidificar e reforçar o que foi construído. Mas foi construído, e o que foi construído é uma obra que nos orgulha a todos. Nas faldas da montanha, nas margens das ribeiras da Goldra e da Carpinteira, hoje temos modernas faculdades levantadas sobre as ruínas das fábricas de outrora, temos salas de aula, laboratórios e gabinetes, onde professores e alunos dos três ciclos ensinam, estudam e investigam. Houve visão, houve querer, houve determinação, capacidade de execução, para erguer a universidade que temos. Sem a dedicação, o empenho e o amor á UBI, demonstrado comprovadamente pelos reitores que me antecederam no cargo, não estaríamos aqui neste momento de passagem de testemunho reitoral.
(…)
Uma palavra de confiança, para terminar. A UBI nasceu porque outros antes de nós quiseram que ela nascesse para desenvolver a nossa região. Unidos e coesos, nós venceremos os desafios que se avizinham e faremos uma UBI mais viva e mais forte ao serviço da região e de Portugal.
O título, o subtítulo e os intertítulos são da responsabilidade da redação de Notas de Circunstância.