Editorial O “impossível” exequível

J.-M. Nobre-Correia

Só uma política voluntarista de reivindicação constante em relação a uma política centralizadora imemorial é de natureza a inverter a tendência que está a conduzir à desertificação do “interior”…


A publicação recente da classificação das escolas do país (a que, em português de cão, chamam “ranking”…) pôs de novo em evidência dois mundos. De um lado, o Portugal do litoral centro-norte. Do outro, o resto do país…

De um lado as primeiras 52 escolas, situadas todas nesse tal litoral centro-norte (a 53.a sendo a Escola Secundário do Fundão) [1]. Mas, atenção, Lisboa (e a sua “área metropolitana”) conta nada menos 26 destas 52 : exatamente metade ! Ora, esta classificação pretende dizer quais são as melhores escolas de um total de 495. E como é elaborada a partir dos resultados obtidos nos “exames nacionais”, surgem inevitavelmente duas interrogações.

A primeira interrogação consiste em perguntar se será de facto no litoral centro-norte que, por obra do divino espírito santo, se encontram as melhores inteligências da juventude do país ? E a segunda parece igualmente impor-se : será na “capital do império” que, uma vez mais, se encontram as inteligências mais brilhantes desta mesma juventude ?

A triste realidade é que é nesse mesmo litoral centro-norte e nessa mesma região de Lisboa que se encontram, muito provavelmente, as melhores infraestruturas escolares e os melhores “enquadramentos” pedagógicos, assim como, com toda a certeza, o contexto sociocultural mais favorável ao desabrochamento intelectual dos jovens. E é o conjunto destas condições de base que leva as famílias a quererem que os seus filhos se inscrevam em escolas do litoral centro-norte, de preferência em Lisboa, eventualmente no Porto ou em Coimbra. Que as leva a encarar a hipótese de elas próprias se instalarem lá para facilitarem a escolarização dos filhos. Aumentando a concentração demográfica no litoral centro-norte e sobretudo em Lisboa, e, paralelamente, a desertificação do “interior” centro-norte e do sul abaixo do Tejo.

Este feixe de situações e tendências só poderá ser invertido com uma política voluntarista lúcida e realista, inspirada em exemplos de países da Velha Europa. Decidindo, por exemplo, que boa parte das escolas superiores públicas instaladas em Lisboa e na sua região sejam transferidas para “o interior” e reagrupadas com as existentes.

É conhecido o papel que a universidade e os dois institutos politécnicos têm como fatores de dinâmica cultural, social e económica da Beira Interior. O reforço destes polos aumentaria a atratividade de cada um deles e, por conseguinte, da região. Urge pois reivindicar o que parece impossível e é, de facto, perfeitissimamente exequível. Prestando aliás um serviço a Lisboa, descongestionando-a…


[1] Segundo o « caderno destacável » do Expresso de 9 de novembro de 2013, pp. VIII-IX.